Entrevista do senador Aécio Neves no lançamento do filme "Tancredo, a Travessia"
Belo Horizonte - 27-10-11
Assuntos: Documentário "Tancredo, a Travessia", legado de Tancredo Neves, demissão do ministro do Esporte, corrupção no governo federal
Sobre a importância do documentário.
Aécio Neves: Na verdade, para todos os brasileiros. Principalmente, para as gerações mais jovens, que talvez não se lembrem com muita clareza que há 25 anos o Brasil vivia uma ditadura. Acho que é uma aula, uma aula de história. A nossa intenção, inclusive, é que esse filme possa ser visto nas escolas de Ensino Médio, nas universidades, porque o que construímos, o que nós conquistamos, eu digo nós, brasileiros, inclusive de gerações antes da minha, é algo muito valioso. Vivemos hoje na plena democracia, com acesso à informação, com as instituições funcionando, absolutamente livres. É uma conquista tão consistente, tão importante para o nosso futuro, que ela merece ser valorizada. E esse filme permite isso. Permite a valorização da nossa história, mostra a travessia, a dificuldade. Muitos ficaram pelo caminho, na verdade, para que hoje, sobretudo os mais jovens, possam viver num país que cresce, que se desenvolve economicamente e com suas instituições democráticas estáveis. Portanto, não é um filme familiar. Na verdade, Silvio Tendler já havia feita Jango, Juscelino, e agora ele completa uma trilogia, trazendo aos brasileiros a oportunidade de conhecer pela ótica, pelo olhar, pela história de Tancredo, o que aconteceu no Brasil nos últimos 50 anos.
O sexto ministro que cai, senador. Qual a avaliação que a oposição faz nesse momento? Vai ser um governo marcado pela corrupção, pelo menos no início?
Aécio Neves:
Olha, eu dizia desde o início da formação do governo que essa lógica, pela qual o governo se compôs, não tinha condições de dar certo. Primeiro, o inchaço da máquina. Não se justifica, em um país como o Brasil, termos praticamente 40 ministérios. Estados Unidos, Inglaterra, por exemplo, tem de 15 a 18 ministérios. Não funciona, não há condições de você avaliar a ação dos ministros. Ainda mais com a lógica de entregar aos partidos políticos ministérios como se fossem feudos. Infelizmente, isso não aconteceu de ontem para hoje, é claro que o governo sabia o que estava acontecendo no Ministério do Esporte, como sabia o que estava acontecendo nos outros ministérios. O que, apenas, é que o chamado malfeito, para usar um termo que a presidente gosta de usar, é só enfrentado quando vira escândalo. A verdade é essa. Enquanto não vira escândalo, há uma certa complacência, o governo parece que convive bem com esse aparelhamento absurdo da máquina pública. Em relação ao Segundo Tempo, eu me lembro, que ainda eu era governo no meu primeiro mandato, procuramos o Ministério do Esporte porque eles cancelaram as parcerias com o Estado. Esse programa era em parceria com o Estado e o Estado fazia convênios com municípios apenas, exatamente com a intenção, obviamente, estamos vendo agora, não imaginava naquele tempo, de aparelhar como aparelhou. O resto é consequência disso. Infelizmente, é muito ruim para o Brasil que isso esteja acontecendo. Mas, enquanto não tivermos um governo que efetivamente invista em gestão pública de qualidade, que governo com planejamento, com coragem política para ousar nas reformas que não aconteceram, vamos assistir a isso, a cada dia um problema. E é um governo reativo. Nenhuma dessas denúncias, nenhuma dessas quedas de ministros se deu por uma ação do governo, por uma avaliação interna do governo, através de auditorias prévias, como fazíamos em Minas. Essas quedas de ministros não se deram porque a Controladoria-Geral da União denunciou esses problemas, identificou esses problemas. Não. Todas elas ocorreram por denúncias da imprensa, por pressão da opinião pública. O governo age reativamente. Enquanto não houver denúncia, está tudo bem. Infelizmente, o Brasil está perdendo um tempo enorme, de avançar com uma velocidade muito maior, com um governo muito mais eficiente.
E sucessão presidencial. Como chega lá?
Aécio Neves:
Não tenho essa preocupação hoje. Temos uma agenda enorme a construir aqui em Minas Gerais, no Parlamento. E vou repetir aqui em homenagem ao Tancredo, vocês que são convidados, obviamente, para assistir o filme, ouvirão isso da própria boca dele: política é destino. E Presidência, mais do que qualquer outro posto, é mais destino ainda. Vamos trabalhar como temos feito e, obviamente, se esse desafio couber a mim ou a outro companheiro, cada um de nós tem que estar pronto para ele.
Qual o principal legado deixado pro Tancredo, tanto como homem público, como um cidadão comum?
Aécio Neves
Tancredo tinha duas características que se complementavam. Talvez a mais conhecida ou reconhecida é a do grande conciliador, o homem capaz de articular forças díspares, forças antagônicas em busca de um objetivo comum, como foi o processo de transição democrática. A mais bela obra política não apenas da história do Brasil, mas certamente da América Latina. Mas, ao lado do conciliador, do homem do diálogo, existia o homem corajoso. Aqui, vamos assistir vários episódios em que Tancredo, até do ponto de vista físico, pessoal, ficou ao lado da Constituição, ao lado da democracia, das liberdades. Foi assim enquanto ministro de Getúlio Vargas, no dia fatal, no momento em que Getúlio entrega a sua própria vida pela Constituição, Tancredo estava ao seu lado propondo a resistência pessoal. Depois, mais uma vez, na posse de Jango, ele no Parlamento, fisicamente, enfrentou o presidente do Congresso que declarou vaga à Presidência da República, enquanto Jango ainda estava em território brasileiro. Tem uma casa belíssima de Juscelino que vamos também assistir no filme, que Juscelino escreve de próprio punho, quando vai para o exílio, momento de dor para ele, ele diz que se lembra bem que a mão de Tancredo foi a última que ele apertou no momento em que ia para o exílio. Enfim, há uma série de acontecimentos que mostram que, ao lado do grande conciliador, existia também um homem extremamente corajoso, em defesa das suas ideias, daquilo em que acreditava. Nessa política de hoje, de tantas denúncias, essa política tão rasteira, esse aparelhamento da máquina pública como jamais se viu antes na história do Brasil, partidos políticos que crescem a cada dia, que surgem a cada dia, sem representar absolutamente nada, é bom lembrarmos que em um passado não muito distante, no Brasil, tivemos políticos que construíram as bases para que as nossas gerações construam um futuro melhor para todos. Tancredo é motivo de orgulho não para mim apenas como seu neto, para minha mãe, sua filha, para minhas irmãs, pros outros parentes. É motivo de orgulho para todos brasileiros.
Belo Horizonte - 27-10-11
Assuntos: Documentário "Tancredo, a Travessia", legado de Tancredo Neves, demissão do ministro do Esporte, corrupção no governo federal
Sobre a importância do documentário.
Aécio Neves: Na verdade, para todos os brasileiros. Principalmente, para as gerações mais jovens, que talvez não se lembrem com muita clareza que há 25 anos o Brasil vivia uma ditadura. Acho que é uma aula, uma aula de história. A nossa intenção, inclusive, é que esse filme possa ser visto nas escolas de Ensino Médio, nas universidades, porque o que construímos, o que nós conquistamos, eu digo nós, brasileiros, inclusive de gerações antes da minha, é algo muito valioso. Vivemos hoje na plena democracia, com acesso à informação, com as instituições funcionando, absolutamente livres. É uma conquista tão consistente, tão importante para o nosso futuro, que ela merece ser valorizada. E esse filme permite isso. Permite a valorização da nossa história, mostra a travessia, a dificuldade. Muitos ficaram pelo caminho, na verdade, para que hoje, sobretudo os mais jovens, possam viver num país que cresce, que se desenvolve economicamente e com suas instituições democráticas estáveis. Portanto, não é um filme familiar. Na verdade, Silvio Tendler já havia feita Jango, Juscelino, e agora ele completa uma trilogia, trazendo aos brasileiros a oportunidade de conhecer pela ótica, pelo olhar, pela história de Tancredo, o que aconteceu no Brasil nos últimos 50 anos.
O sexto ministro que cai, senador. Qual a avaliação que a oposição faz nesse momento? Vai ser um governo marcado pela corrupção, pelo menos no início?
Aécio Neves:
Olha, eu dizia desde o início da formação do governo que essa lógica, pela qual o governo se compôs, não tinha condições de dar certo. Primeiro, o inchaço da máquina. Não se justifica, em um país como o Brasil, termos praticamente 40 ministérios. Estados Unidos, Inglaterra, por exemplo, tem de 15 a 18 ministérios. Não funciona, não há condições de você avaliar a ação dos ministros. Ainda mais com a lógica de entregar aos partidos políticos ministérios como se fossem feudos. Infelizmente, isso não aconteceu de ontem para hoje, é claro que o governo sabia o que estava acontecendo no Ministério do Esporte, como sabia o que estava acontecendo nos outros ministérios. O que, apenas, é que o chamado malfeito, para usar um termo que a presidente gosta de usar, é só enfrentado quando vira escândalo. A verdade é essa. Enquanto não vira escândalo, há uma certa complacência, o governo parece que convive bem com esse aparelhamento absurdo da máquina pública. Em relação ao Segundo Tempo, eu me lembro, que ainda eu era governo no meu primeiro mandato, procuramos o Ministério do Esporte porque eles cancelaram as parcerias com o Estado. Esse programa era em parceria com o Estado e o Estado fazia convênios com municípios apenas, exatamente com a intenção, obviamente, estamos vendo agora, não imaginava naquele tempo, de aparelhar como aparelhou. O resto é consequência disso. Infelizmente, é muito ruim para o Brasil que isso esteja acontecendo. Mas, enquanto não tivermos um governo que efetivamente invista em gestão pública de qualidade, que governo com planejamento, com coragem política para ousar nas reformas que não aconteceram, vamos assistir a isso, a cada dia um problema. E é um governo reativo. Nenhuma dessas denúncias, nenhuma dessas quedas de ministros se deu por uma ação do governo, por uma avaliação interna do governo, através de auditorias prévias, como fazíamos em Minas. Essas quedas de ministros não se deram porque a Controladoria-Geral da União denunciou esses problemas, identificou esses problemas. Não. Todas elas ocorreram por denúncias da imprensa, por pressão da opinião pública. O governo age reativamente. Enquanto não houver denúncia, está tudo bem. Infelizmente, o Brasil está perdendo um tempo enorme, de avançar com uma velocidade muito maior, com um governo muito mais eficiente.
E sucessão presidencial. Como chega lá?
Aécio Neves:
Não tenho essa preocupação hoje. Temos uma agenda enorme a construir aqui em Minas Gerais, no Parlamento. E vou repetir aqui em homenagem ao Tancredo, vocês que são convidados, obviamente, para assistir o filme, ouvirão isso da própria boca dele: política é destino. E Presidência, mais do que qualquer outro posto, é mais destino ainda. Vamos trabalhar como temos feito e, obviamente, se esse desafio couber a mim ou a outro companheiro, cada um de nós tem que estar pronto para ele.
Qual o principal legado deixado pro Tancredo, tanto como homem público, como um cidadão comum?
Aécio Neves
Tancredo tinha duas características que se complementavam. Talvez a mais conhecida ou reconhecida é a do grande conciliador, o homem capaz de articular forças díspares, forças antagônicas em busca de um objetivo comum, como foi o processo de transição democrática. A mais bela obra política não apenas da história do Brasil, mas certamente da América Latina. Mas, ao lado do conciliador, do homem do diálogo, existia o homem corajoso. Aqui, vamos assistir vários episódios em que Tancredo, até do ponto de vista físico, pessoal, ficou ao lado da Constituição, ao lado da democracia, das liberdades. Foi assim enquanto ministro de Getúlio Vargas, no dia fatal, no momento em que Getúlio entrega a sua própria vida pela Constituição, Tancredo estava ao seu lado propondo a resistência pessoal. Depois, mais uma vez, na posse de Jango, ele no Parlamento, fisicamente, enfrentou o presidente do Congresso que declarou vaga à Presidência da República, enquanto Jango ainda estava em território brasileiro. Tem uma casa belíssima de Juscelino que vamos também assistir no filme, que Juscelino escreve de próprio punho, quando vai para o exílio, momento de dor para ele, ele diz que se lembra bem que a mão de Tancredo foi a última que ele apertou no momento em que ia para o exílio. Enfim, há uma série de acontecimentos que mostram que, ao lado do grande conciliador, existia também um homem extremamente corajoso, em defesa das suas ideias, daquilo em que acreditava. Nessa política de hoje, de tantas denúncias, essa política tão rasteira, esse aparelhamento da máquina pública como jamais se viu antes na história do Brasil, partidos políticos que crescem a cada dia, que surgem a cada dia, sem representar absolutamente nada, é bom lembrarmos que em um passado não muito distante, no Brasil, tivemos políticos que construíram as bases para que as nossas gerações construam um futuro melhor para todos. Tancredo é motivo de orgulho não para mim apenas como seu neto, para minha mãe, sua filha, para minhas irmãs, pros outros parentes. É motivo de orgulho para todos brasileiros.