Aécio dá o seu recado : " Só os frágeis temem dialogar com o Governo"

ISTOÉ Brasil
Brasileiro do ano 2010
|  N° Edição:  2145 |  16.Dez.10 - 12:00 |  Atualizado em 16.Dez.10 - 16:40
Senador eleito com 7,6 milhões de votos, Aécio Neves faz seu sucessor no governo mineiro, provoca um processo de renovação no PSDB e desponta como a grande liderança de uma oposição dura, mas qualificada

Luiza Villaméa/ Foto: Pedro Dias
No alto de uma ladeira de tirar o fôlego no bairro Anchieta, em Belo Horizonte, o amplo apartamento de Aécio Neves (PSDB) tem uma vista fabulosa da capital mineira. Aos 50 anos, senador eleito com 7,6 milhões de votos, Aécio mantém os pés nas montanhas, mas demonstra mirar muito além do horizonte. Ele tem um projeto para o Brasil. E encontra inspiração até dentro de casa. Entre as telas de pintores mineiros de seu apartamento destaca-se um óleo de Carlos Bracher que retrata o Congresso Nacional com espessa massa de tinta e tons sombrios. "Quero levar oxigênio novo para o Senado", diz Aécio. Na prática, isso significa se antecipar à posse marcada para o dia 10 de fevereiro e não parar de traçar estratégias de ação com seus pares, sejam eles da oposição, sejam da base do governo. Convencido da necessidade de promover a "refundação" do PSDB e de recuperar o papel moderador do Senado, Aécio pretende apresentar uma agenda da oposição a Dilma Rousseff (PT) ainda nas primeiras semanas do futuro governo. "Só os frágeis temem dialogar com o governo", argumenta o ex-governador de Minas Gerais. Escolhido o Brasileiro do Ano na Política por ISTOÉ, Aécio encerra 2010 preparando o futuro, depois de somar à própria consagração nas urnas as vitórias de Itamar Franco (PPS), também para o Senado, e de Antonio Anastasia (PSDB), seu antes desconhecido vice, para o governo de Minas Gerais.
Instalado na sala de estar do apartamento que ficou praticamente sem uso durante os dois mandatos no governo mineiro, Aécio demonstra tamanho entusiasmo com o que vem pela frente que chega a surpreender. "Eu estava emprestado no Executivo", diz, referindo-se ao período que encerrou com mais de 90% de aprovação nas pesquisas de opinião pública. Ele, de fato, é um político que pode ser vinculado ao Parlamento desde sempre.
Seu avô paterno, o promotor e professor Tristão Ferreira da Cunha, começou a trajetória política em 1912, como vereador da cidade de Teófilo Otoni (MG) e cumpriu quatro legislaturas como deputado. Seu pai, o advogado Aécio Ferreira da Cunha, falecido aos 83 anos no dia 3 de outubro, foi deputado por 36 anos. Por causa das atividades políticas da família, Aécio, que é nascido em Belo Horizonte, passou boa parte da adolescência e juventude no Rio de Janeiro, cidade que adora e na qual também mantém um apartamento. Só que, em vez de montanhas, do imóvel no Jardim de Alá ele avista um pouquinho da Lagoa Rodrigo de Freitas e do mar.
Definindo-se como um construtor de pontes, Aécio diz
que só os frágeis temem dialogar com o governo
Quando vivia no Rio, Aécio se interessava mais pelo surfe - esporte que gosta de praticar até hoje - do que pela política. Tinha 20 anos quando o avô materno, Tancredo Neves, convocou-o para trabalhar em sua campanha para o governo de Minas. Eleito o avô, Aécio virou seu secretário particular e nunca mais se afastou da política. Antes de ele próprio assumir o governo mineiro, atuou 16 anos como deputado federal, os últimos dois como presidente da Câmara dos Deputados. Herdeiro da tradição familiar, ele também ganhou da avó materna, Risoleta Neves, a caneta Parker-21 com que o presidente Getúlio Vargas (1882- 1954) presenteou o então ministro da Justiça Tancredo Neves pouco antes de se matar, no Palácio do Catete, no Rio de Janeiro. Passadas mais de três décadas, Tancredo chegou a ser eleito presidente, mas morreu antes de tomar posse no Palácio do Planalto - o correspondente ao Catete em Brasília.
Calejado pelos bastidores do poder e pelas reviravoltas da política, Aécio desconversa quanto à possibilidade de disputar a sucessão de Dilma em 2014. Em variação contemporânea do avô Tancredo, que dizia "Presidência é destino", o neto cita Zeca Pagodinho: "Deixa a vida me levar." No decorrer do ano passado, ele bem que defendeu a realização de prévias internas no PSDB, em âmbito nacional, para definir o candidato do partido à sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Diante da resistência da cúpula do partido à proposta, desistiu de entrar na disputa em dezembro de 2009. Um ano depois, ele acredita que, na vida, o melhor é esperar que as circunstâncias criem as condições. "Não se pode ter obsessão", afirma. "A obsessão entristece, tira o foco. E agora meu objetivo é o mandato no Senado."
Antes mesmo de voltar oficialmente ao Parlamento, Aécio articula o que chama de uma agenda da oposição a ser apresentada ao governo federal. Contrariado com o fato de o Congresso estar há décadas andando a reboque do Executivo, o senador eleito sustenta que a nova geração que chega ao Senado precisa propor iniciativas nos campos político e tributário, assim como na gestão pública. "Em vez de ficarmos caudatários da agenda construída pelo governo em função de seus interesses imediatos, de sua estratégia política, precisamos inverter um pouco o jogo", afirma.